sexta-feira, 2 de março de 2012

A Saúde na UTI




Fonte: Correio Popular/Campinas

A crise POLÍTICA agravou o quadro do sistema público de SAÚDE em Campinas. Falta de MÉDICOS e de REMÉDIOS, problemas de infraestrutura, filas para CONSULTAS e violência contra servidores compõem um cenário de DEGRADAÇÃO que coloca...
A crise política que atinge Campinas desde o começo do ano passado, quando surgiram as primeiras denúncias que levaram à cassação do prefeito Hélio de Oliveira Santos (PDT), teve reflexos severos sobre o sistema de saúde pública na cidade. Hoje, depois de quase um ano, a falta de investimentos e de atenção do poder público provocaram problemas de falta de medicamentos, falta de funcionários e sucateamento das unidades básicas de atendimento.
Para piorar o cenário, a Secretaria Municipal de Saúde ainda tem que lidar com dois grandes problemas que podem provocar o caos no atendimento à população: a polêmica sobre a legalidade do convênio com o Cândido Ferreira, responsável por 17,3% da mão de obra, e um impasse com a Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM), que administra o Hospital Ouro Verde e reivindica uma dívida de R$ 10,4 milhões, o que impede a ampliação da capacidade de atendimento do hospital. Além disso, o Município já vinha sofrendo com as consequências do desfinanciamento do Sistema Único de Saúde (SUS) e da falta de investimento ao longo dos últimos anos.
A reportagem do Correio Popular percorreu 12 centros de saúde na cidade nas últimas duas semanas, em diversos bairros, para conferir como estavam. Encontrou usuários insatisfeitos, irritados, se sentindo deixados de lado para retirar medicamentos nas farmácias e na busca por atendimento.
O consultor financeiro Edison Valério foi diagnosticado com distúrbio bipolar, é hipertenso e diabético. Ele tem que tomar sete remédios diferentes por dia, entre eles três doses diárias de sertralina. “Esse remédio está sempre em falta, desde 2009 que tem falta�€ , diz o usuário mostrando receitas médicas com data de 2009 e o carimbo atestando a falta do medicamento no CS Integração.
Como resultado, Valerio está sem tomar o antidepressivo desde 2011. “Eu tenho uma condição que me obriga a usar o tranquilizante. Sem ele perco o controle facilmente e por isso estou sem sair de casa porque tenho medo daminha reação”, conta.
A cada dois meses um psiquiatra deveria avaliar Valerio, mas a última consulta foi no início de agosto de 2011. “Não há psiquiatra no centro e eles não dizem quando terão consulta”, explica. As receitas mensais são assinadas por clínicos gerais, sem que seu estado de saúde seja avaliado.
José Paulo Porsani, presidente do Conselho Municipal de Saúde (CMS) de Campinas, diz que a demora para marcar consulta com especialidades é um dos problemas mais graves enfrentados pelos campineiros. “A espera por uma consulta na oftalmologia chega a demorar oito meses, a prefeitura estu da fazer um convênio com a Sociedade Beneficência Portuguesa para atender os pacientes do município”, afirma.
Cerca de 14 mil pessoas aguardam na fila por uma consulta com oftalmologia. “Temos demanda alta por algumas especialidades como oftalmologia eortopedia”, diz o novo secretário, Fernando Brandão, há 20 dias no cargo. Ele conta que estuda medidas para sanar o problema, entre elas convênios com outras instituições.
A demora para a relização de exames é outra demanda da população. O aposentado Antônio de Paula de Jataí reclama que fez exames simples que demoraram três meses para ficar prontos. “Fiz exames de sangue e urina e demorou três meses para sair o resultado”, afirma. Sua esposa, a dona de casa Maria Eliete Carvalho, atendida pelo CS do Parque Santa Bárbara,diz que espera há seis meses por uma consulta. “Tudo é muito demorado e ainda por cima falta remédio. Fica difícil usar o postinho.”

Cortes
O novo secretário não tem um cenário positivo pela frente. A crise fez a Prefeitura aplicar um contigenciamento de 15% no orçamento desse ano. E os cortes não podem ser feitos em obras em andamento que são financiadas por verbas parlamentares ou por meio de convênios com o governo federal ou . “O corte tem que ser feito na verba que vem do município, vamos ter que fazer cortes em gastos como segurança, manutenção de unidades, compra de material, mas vamos priorizar a compra de remédios”, informou.
No ano passado, apenas 75% do orçamento foi usado por causa da crise. O resultado é a falta de manutenção nas unidades e o desabastecimento de medicamentos e insumos como gaze, soro e atadura. A prefeitura deixou de pagar seus fornecedores durante seis meses, acumulando uma dívida de R$ 13 milhões. “Boa parte dos fornecedores estava sem receber há seis meses. Esses pagamentos são feitos com recursos da secretaria de Finanças, nós não temo s domínio sobre essa situação. Você acaba perdendo credibilidade e enfrenta problemas nas licitações vigentes. Deixa de comprar de empresas melhores e fica com os fornecedores piores por falta de opção”, diz.

OS PRINCIPAIS PROBLEMAS DA REDE PÚBLICA

● Remédios e insumos – Dívidas de R$ 13 milhões com Fornecedores provocaram desabastecimento de 24 medicamentos e de uma série de insumos médicos e odontológicos.
● Déficit de funcionários – Faltam aproximadamente 1,5 mil funcionarios na saúde, segundo estimativa da própria pasta.
● Consulta com especialista - A demora para conseguir uma consulta com especialidades como pediatria, oftalmologia ou psiquiatria chega a ultrapassar oito meses.
● Cândido Ferreira – Justiça considerou ilegal o convênio com o Cândido Ferreira e determinou a anulação. Prefeitura tem que fazer um concurso público para contratar 1,3 mil funcionários.
● Ouro Verde – A SPDM, que administra o Complexo Hospital Ouro Verde, cobra uma dívida de R$ 10,4 milhões, Prefeitura contesta. Enquanto o problema não é resolvido, a ampliação do atendimento à população não é efetivada
● Infraestrutura – A Secretaria de Saúde tem uma verba de apenas R$2,8 milhões por ano para fazer a manutenção de 71 unidades básicas de saúde. O valor é muito abaixo do necessário e vem gerando ao longo dos anos o sucateamento do setor.
● Orçamento – Crise política e o contingenciamento de recursos emperraram o uso do orçamento. Em 2011 isso provocou o corte em itens como manutenção de centros de saúde e compra de medicamentos e insumos.
● Violência – a violência contra os servidores cresceu em 2011. O número de furtos e roubos nas unidades também preocupa a secretaria.

AUMENTAM OS CASOS DE VIOLÊNCIA

As denú ncias de agressão a servidores da Saúde cresceram 50% ano passado em Campinas em relação ao ano anterior. Segundo o Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Municipal Público de Campinas (STMC), toda semana um funcionário é agredido durante o trabalho nos centros de saúde e pronto-socorros da cidade. “A maioria das agressões não chega à polícia porque o servidor tem medo de represálias”, diz João das Graças Silva, diretor de Saúde do sindicato.
Alguns dos casos mais graves ocorridos esse ano em Campinas não foram registrados na polícia. No dia 17 de outubro, um médico do centro de saúde Oziel foi agredido por uma paciente de saúde mental que discordou do encaminhamento feito pelos profissionais. E em setembro uma médica da unidade Anchieta foi agredida com socos. “Uma mulher com uma filha de 13 anos demorou para ser atendida e quando entrou no consultório deu socos e pontapés na médica. Ela pediu exoneração, ficou com medo dos band idos”, conta o diretor.
O CS Oziel é apontado pelo sindicato como uma das unidades mais violentas. Mesmo assim, não há um vigilante no local. “A Guarda Municipal passa aqui uma vez por dia, entra para assinar um papel e sai. Não adianta nada”, diz uma funcionária.
O local não é cercado e durante a noite se transforma em ponto de consumo de drogas. “Isso aqui durante a madrugada se transforma num bordel. É preciso cercar o local”, informa João Xavier, do conselho local de saúde.
A servidora conta que as agressões são constantes e os xingamentos, diários. “Há poucos dias uma funcionária foi ameaçada pelo pai de um paciente porque se recusou a atender uma criança de 8 anos sem acompanhamento dos responsáveis”, conta
Um dos 11 casos que foram parar na delegacia esse ano foi o da médica do CS União de Bairros, agredida pela mãe de um paciente. O roubo de computadores e do carro de uma funcionária do CS São Cristóvão tambà ©m virou caso de polícia. Foi o segundo caso de violência no período de um ano. Em janeiro o dentista da unidade teve a moto roubada dentro do estacionamento.
Como no Oziel, não há um vigilante no local. Em dezembro duas unidades fizeram paralisações para reivindicar segurança. No CS Capivari, um caso ocorrido no final de novembro levou os servidores a paralisar as atividades. Uma usuária jogou uma cesta com preservativos no rosto da recepcionista que estava ao telefone. “Ele ficou revoltada porque a recepcionista pediu para ela esperar e atirou a cesta”, contou uma funcionária do centro. (PA/AAN)

LEITOS ESTÃO NO LIMITE

O número de leitos hospitalares está no limite do que é recomendado pelo Ministério da Saúde (MS). Segundo dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), a cidade tem 2.753 leitos hospitalares, uma média de 2,5 leitos para cada mil habitantes, o mínim o recomendado pelo MS.
O único projeto para aumentar o número de leitos é a resolução do impasse entre a prefeitura e a Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM) para ampliação dos serviços prestados no Complexo Hospitalar Ouro Verde. 85 leitos, incluindo 30 da Unidade de Terapia Intensiva (UTI), estão fechados no local. O Ouro Verde tem capacidade para funcionar com 220 leitos - sendo 170 hospitalares e 50 na UTI. Deste número, 135 leitos estão abertos – apenas 20 em funcionamento na UTI. Caso o repasse da verba do governo federal seja liberado, a expectativa é de que em um prazo de 90 a 120 dias seja possível abrir todas as alas fechadas. (Gláucia Santinello/AAN

FALTA DE INVESTIMENTOS SUCATEOU AS UNIDADES

A falta de investimento em reformas ou manutenção preventiva ao longo de décadas sucateou as unidades de saúde em Campinas. Um levantamento feito pela própria secretaria de Saúde mostra que 76% dos centros de saúde, ou 49 das 64 unidades, precisam de reformas ou ampliação. Um total de 16 unidades precisam ser ampliadas para melhorar o atendimento à população.
O problema atingiu níveis críticos.No final do ano passado parte da laje do módulo de saúde Rosália caiu e a sala ficou interditada para atendimentos. E no início do mês a rede de água do prédio onde funciona a Policlínica 3 e o CS Faria Lima rompeu, alagando parte do prédio.
O quadro é agravado por uma série de atrasos em obras consideradas essenciais para melhorar o atendimento à população. Centros previstos para inaugurar ano passado ainda não sairam do papel e não há previsão para que as obras sejam concluídas. O atraso se deve à combinação da burocracia para revisão de contratos ao calote sofrido por várias empresas que prestam serviço para a prefeitura no ano passado.

Um caso emblemático< /em>
é o CS Rosália, que está praticamente pronto, mas a finalização da obra está atrasada por conta da burocracia para a aprovação do aditamento do contrato. Enquanto isso não sai do papel, a população tem que se deslocar para outros bairros em busca de atendimento.
A construção dos centros de saúde São Bernardo, Parque Oziel e Itatinga está comprometida porque a empresa que venceu a licitação para executar esses projetos rescindiu o contrato com a prefeitura por falta de pagamento. Uma nova licitação teve de ser feita e os contratos, revistos.

Falta de Verba para Manutenção
A Secretaria de Saúde conta com uma verba anual de R$ 2,8 milhões por ano para executar obras em todas as suas mais de 100 unidades, que incluem pronto-socorros, centros de saúde, CAPs e policlínicas, ambulatórios e laboratório. O valor, admite Mauro Aranha, diretor do Departamento Administrativo da Secre taria de Saúde, é muito aquém da necessidade. A verba é usada também para atender manutenções emergenciais, entupimento e quebra de equipamentos, além de reformas e manutenções preventivas.
A pasta tem ainda uma pequena equipe com 10 profissionais que atuam na manutenção das unidades. "A ideia é aumentar esse quadro e criar várias equipes apra descentralizar oatendimento, o que iria agilizar a realização de pequenos reparos", afirma Mauro. (PA/AAN)

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